sexta-feira, 11 de junho de 2010

Escudos ativados

Rocha magnetizada deu início ao campo magnético num passado próximo ao da origem da vida.

Por: John Matson (Geofísico da University of Rochester).

O potente campo magnético da Terra protege o planeta e seus habitantes do impacto total do vento solar, uma torrente de partículas carregadas que, em planetas menos protegidos como Vênus e Marte, com o passar do tempo eliminou suas reservas de água e degradou suas atmosferas. Desvendar a sequência de fatos que deu origem a esse campo magnético e o mecanismo que o gerou - um dínamo de fluido condutor no núcleo externo da Terra - pode ajudar a limitar a história da origem do planeta, incluindo a influência recíproca dos processos geológico, atmosférico e astronômico que tornaram o mundo habitável.

O geofísico John A. Tarduno, da University of Rochester, e seus colegas tentaram fazer exatamente isso, apresentando evidências de que a Terra tinha um dínamo gerador de campo magnético desde 3,45 bilhões de anos atrás, apenas cerca de 1 bilhão de anos após o planeta ter se formado. A nova pesquisa, publicada em 5 de março na Science, desloca o registro da Terra para pelo menos 200 milhões de anos antes. Em 2007, outro grupo já havia apresentado evidência similar, proveniente de rochas ligeiramente mais jovens, para a argumentação da existência de um forte campo magnético terrestre há 3,2 bilhões de anos.

Tarduno e seu grupo analisaram rochas do cráton de Kaapvaal, região do extremo sul da África que apresenta uma crosta do início do período Arqueano relativamente bem preservada (o éon Arqueano teve início há cerca de 3,8 bilhões de anos e terminou há 2,5 bilhões de anos). Em 2009 eles descobriram que algumas das rochas foram magnetizadas há 3,45 bilhões de anos - coincidindo, aproximadamente, com as evidências diretas do aparecimento da primeira forma de vida na Terra, há 3,5 bilhões de anos. Entretanto, uma fonte externa de magnetismo - como uma rajada de vento solar - não pode ser desconsiderada. Vênus, por exemplo, que não tem um campo magnético interno forte, apresenta um campo externo fraco induzido pelo impacto do vento solar na atmosfera densa do planeta.

O novo estudo examina a força magnético necessária para imprimir magnetismo nas rochas do Kaapvaal e conclui que o campo tinha 50% ou 70% de sua força atual. Esse valor é muitas vezes maior do que o esperado para um campo magnético de origem externa, como o fraco campo venusiano, confirmando a presença de um dínamo terrestre interior naquela época.

Os pesquisadores então foram além para verificar com que eficácia o campo poderia manter afastado o vento solar e descobriram que no início do Arqueano a magnetopausa, região do espaço onde o campo magnético encontra o vento solar, ficava a cerca de 30 mil km ou menos da Terra. A magnetopausa apresenta o dobro dessa distância atualmente, mas pode mudar em resposta a explosões energéticas extremas do Sol. "Aquelas condições estáveis de 3,5 bilhões de anos atrás são semelhantes ao que vemos atualmente durante fortes tempestades solares", nota Tarduno. Com a magnetopausa tão próxima, a Terra não poderia estar completamente protegida do vento solar e pode ter perdido muito de sua água.

Conforme se intensificam os esforços para encontrar planetas como a Terra fora do Sistema Solar, Tarduno observa que a relação entre o vento estelar, atmosferas e campos magnéticos deve ser levadas em consideração quando se projeta o potencial de habitabilidade de um planeta. Ele acrescenta que o impacto do compo magnético na reserva de água de um planeta é particularmente importante.

Peter A. Selkin, geólogo da University of Washington, em Tacoma, acha esse trabalho interessante e os resultados plausíveis, embora observe que mesmo as rochas relativamente bem preservadas do cráton de Kaapvaal foram submetidas a mudanças mineralógicas e de temperatura em pequena escala durante bilhões de anos. "Elas não se encontram no exato estado em que estava inicialmente", acrescenta. "Acredito que existam coisas que ainda devemos descobrir sobre os minerais que Tarduno e seus coautores utilizaram nesse estudo para aceitarmos completamente os resultados".

David J. Dunlop, geofísico da University of Toronto, está mais convencido, e classifica o trabalho como uma "demonstração muito cuidadosa". Os campos de força, segundo ele, "podem ser determinados com bastante segurança" para o intervalo de 3,4 bilhões a 3,45 bilhões de anos atrás. "Seria muito interessante se antecipássemos o princípio do geodínamo ainda mais, mas isso não parece viável", acrescenta. Segundo ele, em nenhum outro lugar do mundo a Natureza foi tão gentil ao preservar tão bem portadoras do antigo magnetismo.

(Fonte: Scientific American - Edição de Junho de 2010, páginas 13 e 14).

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